À primeira vista, muitas pessoas imaginam o sistema escravista brasileiro pelo prisma da servidão cativa negra. A verdade é que, ao longo do século XVI, a escravidão indígena, pelas dificuldades materiais da colônia, foi de fundamental importância para a consolidação do modo de produção escravista no Brasil. Foram as epidemias, que os matavam aos milhares, que levaram a um aumento cada vez maior do número da mão de obra escravizada africana, por pressão dos jesuítas.

Esses escravizados africanos foram de fundamental importância para a acumulação de capital da coroa portuguesa e dos senhores de engenho. É seguro dizer que não haveria capitalismo sem escravidão. Isso porque, como veremos adiante, não apenas a produção de mercadorias por mão de obra escravizada serviu como a fonte de produção da riqueza comercial dos grandes impérios coloniais dos séculos XVI a XVIII, como essa mão de obra escravizada, também, foi de fundamental importância para a produção de matérias-primas essenciais para a reprodução da força de trabalho do capitalismo industrial nascente do final do século XVIII até meados do século XIX, tendo o Brasil, junto dos EUA e Cuba, um papel fundamental nesse processo de integração entre trabalho escravo e produção industrial assalariada na acumulação de capital dos países centrais do capitalismo.

O tráfico transatlântico sequestrou milhões de pessoas da costa do continente africano para trabalharem sob um regime de servidão que, diante da filosofia e dos valores iluministas da época, só poderia ser justificado através de uma desumanização, assim como foi operada sobre os povos indígenas, também sobre os povos africanos. A desumanização de povos negros para fomentar uma visão desses indivíduos como “atrasados” e “selvagens” que precisavam ser civilizados e cuja servidão escravista serviria como uma forma de educação para o trabalho e subserviência aos povos mais “evoluídos” da Europa.

Por: Gabriel Belarmino

Fonte:

MARQUESE, Rafael. "A dinâmica da escravidão no Brasil: resistência, tráfico negreiro e alforrias, século XVII a XIX", In. Novos Estudos, CEBRAP (74), Março de 2006.